abril 01, 2011

MUSEU, EDUCAÇÃO, RAZÃO, IMAGINAÇÃO, EMOÇÃO

Alguns pontos específicos da postagem de Maria Isabel Leite no blog Repensando Museus, referente à visita ao Museu Oscar Niemeyer - MON, em Curitiba, cutucaram minha razão e imaginação, e impulsionaram a minha busca por sentido (tem base?) e significado (que valor atribuo a isso?). 

Primeiro: a citação do Niemeyer, “a razão é inimiga da imaginação”. Será? Uma questão se coloca de cara para mim: é possível “imaginar” sem...? Ei! Foi muito fácil transformar o substantivo “imaginação” em um agir, imaginar. Mas e “razão”? Complicou. Poderia ser raciocinar? Racionalizar? Razoar? Logicar?

Minha procura por um verbo se justifica: substantivos são nominações conceituais amplas e, quando se referem a processos, tendem a “coisificar”, isto é, transformar em um objeto conceitual, em uma “coisa” mais ou menos estática, o que é dinâmico e está em movimento.

“Imaginação” é um desses casos. O que a gente detecta no mundo não é a “imaginação”, não é mesmo?, mas pessoas imaginando, fantasiando, idealizando, concebendo, criando, inventando... “Razão” é outro caso. O que a gente percebe são pessoas pensando, raciocinando, racionalizando, razoando, ponderando, refletindo, logicando. Pergunto: quando penso, imagino? Quando imagino, logico?

O ser humano é, ao que parece, o único animal capaz de pensar-se, função mental das mais complexas, e que se dá com o envolvimento de uma camada cerebral específica, bastante desenvolvida em nossos cérebros de gente: os lobos frontais. Sem a área frontal e as áreas de associação corticais que integram as informações recebidas pelo sistema nervoso, e que aparecem nos últimos estágios da evolução do cérebro, não é possível pensar(se), racionalizar, logicar, planejar, refletir, razoar, criar, idealizar, fantasiar, conceber, ou imaginar.

Como diz o neurocientista Oliver Sacks, no prefácio ao livro de outro neurocientista, Elkhonon Goldberg (“O Cérebro Executivo”, RJ: Imago Ed., 2002), “Este é o papel dos lobos frontais, o de liberar o organismo de repertórios e reações fixas, permitindo a representação mental de alternativas, imaginação, liberdade. [...] A intencionalidade do indivíduo está investida nos lobos frontais, e estes são cruciais para a consciência mais elevada, para julgamento, imaginação, empatia, identidade, ‘alma’”. Desde esse ponto de vista, poderíamos dizer que imaginar e razoar e, portanto, imaginação e razão, caminham juntas e não se opõem. Isso me faz lembrar outro neurocientista interessante para meus argumentos – António Damásio.

Damásio, ao explicar a participação das emoções nesses mesmos processos mencionados acima, afirma que elas “parecem constituir um sistema de apoio sem o qual o edifício da razão não pode operar a contento”. Em suas pesquisas com pacientes lesionados em áreas cerebrais que afetam a emoção, Damásio descobriu que a impossibilidade de formar e perceber estados emocionais torna o indivíduo incapaz de trabalhar com prioridades e valores e, em consequência, incapaz de ponderar, decidir, escolher. 

Pergunto: Não seria então que imaginar e logicar comporiam a mesma teia do emocionar que valora e prioriza, enquanto planeja e concebe a representação que é sua escolha criativa? 

Penso nisso enquanto sigo a leitura da postagem de Maria Isabel, e encontro meu segundo ponto de enfoque: “é justamente o estímulo à imaginação que precisamos focar numa visita museal”. Concordo, ainda mais quanto esse estímulo possa emocionar, contaminando as representações imaginadas com os valores sentimentais que marcam modos pessoais de perceber e perceber-se, na criação de sentidos que formem vínculos profundos com os significados. 

A postagem continua: “pensar, fazer associações, ler os textos, trocar ideias...”, esse enriquecimento de cada pedacinho do exposto, curtido aos poucos – “menos é mais”, a partir do degustar, esse prazer (razão e imaginação) de criar a relação com o espaço, o tempo, os objetos. 

E a pergunta: “o que propor após a visitação aos museus de arte?” Pois é. O que propor após a visitação aos museus, em geral? O pessoal de educação parece-me desligado demais das possibilidades que o museu traz, antes e/ou depois da visita, quando há visita. Na minha percepção, é uma certa turma dos museus que tem acordado pra isso. Muito trabalho a fazer. Acho que vale a pena. Penso sobre isso com alguma frequência. Mas isso é assunto para futuras trocas, que agora já escrevi demais.      

4 comentários:

  1. Augusto Cury relata a existência do Homo Bios e do Homo Sapiens, onde o primeiro age com emoção e o segundo com a razão. Nietzche diz que as guerras truxeram mais benefíciouos que o amor ao próximo, então, quem imaginou mais? Quem é o Homo Bios e quem é o Homo Sapiens? Afinal, é aquele que promove a guerra, ou aquele aquele que ensina a PAZ?

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  2. Olá, Felipe.
    Interessantes as suas perguntas. Você já tem respostas formuladas para elas? Ou ainda estão em aberto? Sou ignorante da obra do Augusto Cury, e pouco li, diretamente, do Nietzche. Então, pensando sobre suas perguntas, e para orientar meu raciocínio, pergunto: o "homo bios" seria o "emocional", e o "homo sapiens" o "racional"? Os termos "homo sapiens" e "homo bios" estão sendo usados aqui, presumo, como metáforas para conceitos criados pelo Cury, não como o "homo sapiens" da biologia, espécie da família "hominidae" do gênero humano. É isso, ou não estou entendendo nada?

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  3. O autor em questão afirma que essas, são metáforas transformavéis, onde ao se frustrar o Homo Sapiens se transforma em Homo Bios, ou seja, pensamento e imaginação deixam de ser racionais e passam a ser extintivas e emocionais, e é após alguns segundos desse estado psíquico que tomamos nossas piores decissões, como imaginarmos mazelas para quem nos frustou. Será possivél alguém que pensa em ferir o próximo usar a razão, ou a razão se faz após o arrependimento? Ou será possível amar o próximo e não fazer uso do Homo Bios?

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  4. Fernando,
    a tragédia que ocorreu aqui no Rio, na escola em Realengo, deixou-me tão chocada e impotente que realmente não consigo encontrar nenhum fio de pensamento teórico que me pareça no momento satisfatório para pensar as questões, tal como vc as colocou.
    Minha proposta, na postagem, era muito mais simples, e eu estava pensando no ato imaginativo criador, não no ato imaginativo destruidor.
    Então, por enquanto, estou assim confusa: A emoção que leva ao planejamento de um ato de violência destruidora é racional, só porque há planejamento? É instintiva, só porque há emoção? Ou estamos elaborando em correlações equívocas?

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